IESA - (Re)Pensando Direito - Ano 3 Nº 7 - page 99

(RE) PENSANDO DIREITO
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DOMINAÇÃOMASCULINAEVIOLÊNCIADEGÊNERONOSÉCULOXXI:
Em seus diversos conceitos, seja no conceito legal, seja no
conceito que pode ser obtido mediante diversas visões sociológicas,
a violência contra a mulher parte do pressuposto de que somente ao
homem cabem os jogos da honra (BORDIEU, 2005). Durante séculos
relegada ao lar, a mulher encontrava-se excluída do espaço público,
longe das discussões do mercado ou da assembleia. O exercício da
sexualidademasculina por meio da violência era legítimo na dominação
de gênero porque o homem honrado também era viril, enquanto que
a mulher que exercesse essa sexualidade no espaço público seria
punida como a pior das prostitutas.
A violência sexual contra as mulheres tem relações com uma
ordem burguesa conservadora e repressora, ao menos no que tange
ao discurso. Sobre isso, pronunciou-se Michel Foucault (1985, p.
47) afirmando que “a sociedade burguesa do século XIX instituiu
mecanismos de saturação sexual que retiraram o discurso sobre
a sexualidade do debate público para a esfera privada do casal
monogâmico e conjugal”. Assim, a segregação entre meninos e
meninas nas escolas, a vigilância sobre as crianças afastando-as de
qualquer discussão sobre sexo ou sobre como se dá a reprodução,
o alerta feito aos adolescentes sobre os perigos da masturbação; ao
mesmo tempo em que são permitidos pequenos espaços a expansão
de uma sexualidade reprimida (como na prostituição e no emprego
da pornografia), fizeram com que a sociedade moderna também se
transformasse numa sociedade da perversão. Ao criar uma barreira
rigorosa contra a sexualidade (especialmente a sexualidade feminina),
a sociedade burguesa promoveu a germinação perversa de séria
patologia do instinto sexual. Ao recato do discurso público contrapõe-
se a violência explosiva da perversão sexual. Essa perversão foi
consolidada nos homens, que se tornaram fios condutores do prazer
sexual e da violência decorrente do exercício da virilidade durante o
processo de dominação sobre as mulheres. A isso Foucault (1985,
p. 48) atribui o nome de “proliferação das sexualidades por extensão
do poder”, uma vez que prazer e poder conciliam-se, entrelaçando-
se e encadeando um processo crescente de dominação por meio de
mecanismos complexos de excitação e incitação à prática sexual.
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