IESA - (Re)Pensando Direito - Ano 3 Nº 7 - page 98

96
Ano 4 • n. 7 • jan/jun. • 2014
FernandoAntôniodaSilvaAlves
incerta troca de parceiros, seu destino pode ser até mesmo a morte,
como nos sucessivos casos de violência doméstica em que mulheres
são assassinadas, após discussões conjugais, quando uma das
partes decide pôr fim à relação ou comunica que já tem um novo
companheiro. Em prol do sentimento de posse, legitima-se todo um
arco de violência.
No que tange à violência sexual, a prática dos estupros coletivos
comentada em notícias que chocaram o mundo no início deste texto,
também merece uma análise pormenorizada que Bourdieu (2005)
realizou ao regressar ao tema da virilidademasculina e sua relação com
a violência. Entendia o pensador francês que não apenas as mulheres,
no seu aprendizado de resignação e sujeição, mas também os homens
podiam ser considerados vítimas dos esquemas de dominação de
gênero. Como a cultura da dominação se inscreve no corpo do homem
e da mulher, a partir de suas diferenças físicas, no homem existe toda
uma exaltação da força, virilidade, e, consequentemente, fertilidade de
seu corpo, em que são exaltados valores da masculinidade do homem
durante todo o seu desenvolvimento biológico e integração social,
desde tenra idade, questionando-se por meio de rituais morais, até
que ponto o homem tem capacidade reprodutiva e, portanto, sexual.
Honra e vergonha são duas faces da moeda que materializam
o paradoxo da virilidade na cultura masculina dominante. Assim
como a visita ao bordel fazia parte dos rituais morais de afirmação
da maturidade sexual pelo exercício da virilidade, o estupro coletivo
também teria a finalidade de o indivíduo afirmar-se perante os demais
por meio da violência sexual. Trata-se de uma forma brutal, mas
previsível, de reconhecimento e autoafirmação da masculinidade, que
põe em xeque a função simbólica do macho dominante, daquele que
pode ser propriamente chamado pelos outros integrantes do grupo
de homem. Um homem viril é o homem capaz de penetrar e de gozar
sobre aquela que deve se sujeitar ao seu gozo. O contrário disso
seria a vergonha da impotência, da ausência de virilidade, fertilidade
e, consequentemente, de masculinidade. Para não perder seu capital
simbólico de macho viril e fértil perante o grupo de outros homens, uns
tornam-se fortes candidatos a estupradores.
1...,88,89,90,91,92,93,94,95,96,97 99,100,101,102,103,104,105,106,107,108,...292
Powered by FlippingBook