IESA - (Re)Pensando Direito - Ano 3 Nº 7 - page 187

(RE) PENSANDO DIREITO
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(RE)PENSARNODIREITOÉ: (RE)PENSARNASOCIEDADE,NO INDIVÍDUO,NO INDIVIDUALISMO,NASALVAÇÃO,NOCONTROLEENTREOCENTROEAMARGEM
absurdo, a ansiedade e a alienação
142
. Apenas no século XX o conceito
de devir (transformação) foi totalmente compreendido, com todas as
suas implicações, como a chave do universo
143
.
É grande a tentação de assimilar a cultura do pós-dever com o
grau zero de valores, isto é, com a apoteose do niilismo moderno. Já na
década de 1960, Castoriadis dizia acreditar que os conceitos correntes
sobre bem e mal haviam desaparecido, pois “a ideia geralmente
admitida é que cada um pode fazer o que quiser, e que nada é mal,
basta à pessoa saber safar-se do problema”. Mais recentemente,
Baudrillard caracterizava a sociedade moderna como um sistema sem
parâmetros, em que todos os valores se transmutam, onde tudo se
toca, num interminável movimento contínuo. Há bem pouco tempo,
Allan Bloom afirmava que “já não se pode falar com segurança sobre
bem e mal”, porque hoje, a bem dizer, ninguém crê em mais nada
diante de “uma crise de valores, crise de proporções inauditas”. Os
meios intelectuais deixaram-se cativar em larga medida pelo roteiro
niilista: é sempre a sensação de naufrágio e catástrofe do “deixa tudo
para lá” que predomina na concepção das novas democracias
144
.
Assim, as ideologias da globalização perderam seu crédito, mas
não as exigências morais mínimas indispensáveis para a vida social
e democrática. “Os crimes de sangue, a escravidão, a crueldade, o
estupro, as sevícias, psicológicas e físicas, eis os muitos delitos que,
mais do que nunca, provocam indignação coletiva”
145
.
O ideal de renúncia e abnegação perdeu sua antiga justificativa
moral, mas aquilo que atinge a segurança e a dignidade de cada
pessoa ainda é capaz de revoltar nossas consciências. O público
gosta de consumir a violência quando exposta na mídia, mas a rejeita
na esfera da vida real
146
. A democracia contemporânea não professa o
niilismo, pois a desregulamentação pós-moralista é contida em limites
estritos. Por maior que tenha sido o abalo histórico suscitado pelo “fim
do ciclo do dever”, o senso de indignação moral não está morto.
142 BAUMER, Franklin L.
O pensamento europeu moderno. Volume II.,
p. 179.
143 Ibid., p. 181.
144 Lipovetsky, Gilles.
A sociedade pós-moralista:
o crepúsculo do dever e a ética indolor dos novos tempos democráticos.Tradução
de Armando Braio Ara. São Paulo: Manole, 2005, p. 122.
145
Ibid.,
p. 123.
146
Ibid.,
p. 124.
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