IESA - (Re)Pensando Direito - Ano 3 Nº 7 - page 182

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Ano 4 • n. 7 • jan/jun. • 2014
Carlos JoséPereiraKruber
foi transferida para a felicidade
125
: que a felicidade ostente, à primeira
vista, significado e função que induz a consequências importantes
quanto ao respectivo conteúdo: para ser o veículo do mito igualitário,
é preciso que a felicidade seja mensurável. Importa que se trate do
bem-estar mensurável por objetos e signos do conforto
126
.
Os mitos do bem-estar e das necessidades possuem assim
uma poderosa função ideológica de reabsorção e supressão das
determinações objetivas, sociais e históricas, da desigualdade. Todo
o jogo político do
Welfare State
e da sociedade de consumo consiste
em ultrapassar as próprias contradições, intensificando o volume
dos bens, na perspectiva de uma igualização automática através da
quantidade e de um nível de equilíbrio final
127
, que seria o bem-estar
total para todos. Se essa perspectiva sobre a ideologia do bem-estar for
justa (ou seja, que ela veicula o mito da igualdade formal secularizado
nos bens e nos signos), torna-se então claro que o eterno problema
será a sociedade de consumo igualitária ou desigualitária. Constituirá,
assim, a democracia realizada ou em vias de realização ou, pelo
contrário, devolverão apenas as desigualdades e as estruturas sociais
anteriores? Ora, tudo isso nada significa, uma vez que pôr o problema
em termos de igualização de consumo é já substituir a busca dos
objetos e dos signos pelos verdadeiros problemas e pela respectiva
análise lógica e sociológica
128
.
Edgar Morin cita Freud com o objetivo de explicar que um
problema de fundo foi colocado por e para aquilo que um progresso
de civilização generalizado e irreversível deveria trazer. Para além do
mal-estar pelo qual toda civilização desenvolve os mecanismos de sua
própria destruição, na nossa apareceram sintomas específicos de um
novo mal de civilização: a conjunção dos desenvolvimentos urbanos,
125 BAUMER, Franklin L.
O pensamento europeu moderno. Volume I:
Séculos XVII e XVIII, p. 264.
126 BAUDRILLARD, Jean.
A sociedade do consumo.
Lisboa: Edições 70, 2011, p. 49-50.
127 BAUDRILLARD, Jean.
A sociedade do consumo.
p. 55. O equilíbrio é o fantasma ideal dos economistas, que contradiz, se não
a lógica interna do Estado de sociedade, pelo menos a organização social por toda a parte assinalada. Toda a sociedade origina a
diferenciação, a discriminação social, e esta organização estrutural assenta (entre outros fatores) na utilização e distribuição das
riquezas. O fato de uma sociedade entrar em fase de crescimento, como acontece com as nossas sociedades industriais, não
modifica em nada o processo; pelo contrário, o sistema capitalista (e produtivista em geral) acentuou de certo modo, ao máximo,
semelhante “desnivelamento” funcional e o desequilíbrio, racionalizando-o e generalizando-o a todos os níveis.
128
Ibid.,
p. 51-52.
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